terça-feira, 6 de janeiro de 2009

OBRIGADO ESTRANHO - AS PALAVRAS QUE NUNCA TE DIREI (FIM)

(Última parte)

O lusco-fusco ameaçava já tomar conta do ilhéu naquele dia de Setembro. Gon-Gon, que havia terminado o seu turno faziam poucos minutos, aproveitara os últimos momentos de luz do dia para ir procurar alimento, deixando a Pterodrómia a tarefa de vigilância do ovo. Sem que nada o fizesse prever, um crepitar estranho sobressaltou a jovem fêmea que, não obstante aprestar-se para ser mãe pela primeira vez, sabia perfeitamente de que se tratava: chegara o momento tão esperado! Primeiro a cabeça, depois as asas e finalmente o resto do corpo de Bugio, um passarinho encarquilhado e húmido, surgiram por entre o emaranhado de cascas que o aprisionaram durante vários meses. Pterodrómia limpou com o bico os últimos vestígios de casca sobre a penugem da sua cria e, contemplando aquela frágil criatura que começava agora uma nova vida, soltou uma lágrima que rolou sobre a sua face até ao chão.
Ao chegar a casa e ao deparar-se com aquele cenário idílico, Gon-Gon não disfarçou a emoção e, pegando o recém-nascido nas suas asas, acariciou-o ternamente. O seu filho constituía para ele muito mais do que uma simples cria da sua espécie. Depois de todas as dificuldades por que passara a colónia nos últimos meses, Bugio era, por assim dizer, uma espécie de Messias. Representava uma nova vida, o início de uma nova era para a colónia e para os seus. Gon-Gon beijou Pterodrómia na face e aconchegou ambos os seus tesouros contra as suas asas. Agora sim poderia finalmente dizer que era o macho mais feliz do mundo. Frente à janela, a silhueta da família contra o pôr-do-sol a desaparecer no horizonte transmitiam um sentimento de redobrada esperança e confiança no futuro e Bugio, a jovem cria, constituía indubitavelmente o símbolo máximo de tudo isso.
“Obrigado estranho”, pensou Gon-Gon, suspirando profundamente.


FIM

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